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Gênero e tráfico de pessoas?

Por: Ariana Bazzano¹

Tráfico de pessoas, muitas vezes é tratado como um assunto de segurança internacional, crime organizado, imigração não-documentada, direitos humanos, mas será que podemos dizer que o tráfico de pessoas também é uma questão de gênero?


Gênero é uma categoria analítica das ciências humanas que nos ajuda a compreender as expectativas sociais de feminilidade e masculinidade. Essas expectativas são construídas socialmente e nos ajudam a compreender as relações de poder e subordinação entre os seres humanos. Ao tratar de expectativas sociais, pode-se pensar todo o conjunto de comportamentos, papéis sociais, atributos de personalidades, sanções e estereótipos esperados daqueles e daquelas que são identificados como homens e mulheres.


Aqui vamos nos ater às sanções e estereótipos. O conjunto de estereótipos relacionados à feminilidade se relaciona a: delicadeza, submissão, obediência, maternidade, dentre outros. Em relação à masculinidade, pensamos em: força, dominação, poder, virilidade, etc. Dessa forma, se colocarmos em cada ponta de um polo, dominação e submissão, teremos um aparato conceitual para analisar a relação de subordinação que se estabelece entre o homem sobre a mulher, muitas vezes, de forma totalmente naturalizada. Agora que temos esse aparato conceitual, mesmo que de forma resumida, podemos pensar na relação entre gênero e tráfico de pessoas?


De acordo com a ONU, tráfico de pessoas é o processo de recrutamento, aliciamento, transporte, abrigo de pessoas com a finalidade de explorá-las. Essa exploração pode ocorrer de várias maneiras, tais como: sexual, casamento forçado, laboral, retirada de órgãos e tecidos, adoção ilegal de crianças, dentre outros, trabalhos forçados.


Especialmente, nos casos de exploração sexual (prostituição forçada, escravidão sexual e casamento servil), os dados apontam para um enorme recorte de gênero nessas situações. De acordo com o relatório de 2016 da UNDOC, em situações identificadas de tráfico de pessoas, mulheres e meninas representam 70% das vítimas. E quando restringimos a casos de tráfico de pessoas para exploração sexual, os dados indicam que 96% das vítimas são mulheres e meninas. Nesse último caso, vale destacar que não estão contabilizadas as situações de casamento servil, os números representam os casos de exploração de prostituição e outras práticas similares.


Para além do que os números nos mostram, a desigualdade de gênero passa por algumas questões estruturais presentes na sociedade, como a “cultura de estupro” e a desigualdade econômica. A “cultura de estupro” é a base dos seguintes fenômenos sociais, que estão interligados ao machismo: a sexualização infantil, a pedofilia, o estupro, a violência doméstica, o tráfico de pessoas para fins de exploração sexual. A desigualdade de gênero também pode ser apontada como um fator que diminui a oportunidade e os salários de pessoas (mulheres, homossexuais, transexuais) no mercado de trabalho, dessa forma, a falta de oportunidade profissional pode tornar as pessoas mais suscetíveis à exploração sexual.


Portanto, para pensarmos o combate ao crime de tráfico de pessoas também é necessário reconhecer que são necessárias políticas de promoção à igualdade de gênero, tais como, garantia à educação, formação profissional, combate à desigualdade salarial em virtude dos gêneros; e de proteção que respeitem as especificidades e vulnerabilidades relativas às condições sociais das pessoas suscetíveis ao aliciamento das organizações criminosas.

 

¹ Atualmente, é discente do Doutorado do Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais San Tiago Dantas (UNESP, UNICAMP e PUC-SP). Possui Mestrado em Ciência Política pela Universidade Estadual de Campinas (2011) e graduação em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Londrina (2005). É pesquisadora-colaboradora do Instituto Nacional de Estudos sobre os Estados Unidos (INCT-INEU) e pesquisadora-colaboradora do GETEPOL (Grupo de Estudos em Teoria Política). Tem experiência na área de Ciência Política e Relações Internacionais, atuando principalmente nos seguintes temas: tráfico de pessoas, gênero, segurança internacional, segurança humana e direitos humanos.

 

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